Minha Desconstrução de Conceitos: Estereótipos de Gênero - Parte Final

Nos posts anteriores, eu falei um pouco do papel dos estereótipos de gênero na minha vida como menina/mulher, mas a maioria, eu foquei em dividir algumas informações que me ajudaram e ajudam na minha reflexão diária para desconstruir os estereótipos de gênero aqui em casa. Estas informações focaram mais sobre os efeitos dos estereótipos de gênero em meninos, isto porque queria chegar no ponto do impacto destes estereótipos na Aline mãe.

Através do Instagram da @mymamasaidso (as blogueiras das antigas provavelmente conhecem a Helen do blog Esquilo Adaptado) eu cheguei neste excelente artigo de opinião que saiu na revista Times chamado “How to Raise a Sweet Son in an Era of Angry Men” por Faith Sailie.

Em seu artigo, Faith faz um ponto importante sobre como as pessoas do sexo feminino estão conquistando sua voz e seu espaço e finalmente tendo o direito de demonstrar sua raiva. A autora faz questão de ressaltar uma importante diferença entre a raiva que as mulherem estão demonstrando, onde elas direcionam o sentimento para iniciar uma conversa reflexiva sobre a nossa posição na sociedade, enquanto pessoas do sexo masculino ao exercer seu direito de expressar raiva, muitas vezes tiram vidas. O artigo todo é incrível. Leiam, nem que seja usando o Google tradutor! A autora é mãe de um menino e de uma menina e reflete sobre como estamos empoderando nossas meninas e deixando de fora desta conversa os nossos meninos. Ela comenta que meninos sempre puderam ser qualquer coisa e meninas sempre puderam sentir qualquer coisa e que finalmente estamos em um momento em que a mensagem para as meninas é de que elas podem sentir e ser o que quiserem, no entanto, esquecemos de incluir que os meninos sempre puderam ser o que quisessem e que agora eles deveriam também poder sentir todos os tipos de sentimentos.

Estamos de fato vivendo um momento histórico na quebra dos estereótipos de gênero para as meninas, mas os meninos estão mesmo de lado nesta reflexão atual e como mostrei em alguns posts, isto têm um custo muito alto para o indivíduo e para a sociedade. Finalmente estamos ensinando nossas meninas que elas não precisam ficar sentadas em suas torres à espera do resgate por seu princípe encantado, mas não estamos dizendo aos nossos meninos que tudo que eles sentem é perfeitamente normal e aceitável; que vulnerabilidade não é coisa de mulherzinha e que eles podem e devem expressar o que eles sentem e se sentirem acolhidos para dividir o que eles desejarem dividir.

Reflitam comigo, uma menina para ser considerada masculina, precisa demonstrar um conjunto de posturas e comportamento; o menino basta um único traço e ele já passa a ser vítima de chacota e é visto com “menininha.” Exemplo prático, se uma menina gosta de futebol, ninguém vai fazer piada. Vão aparecer aqueles para dizer que ela não gosta e não entende futebol, mas ninguém vai duvidar de sua feminilidade. Basta um menino gostar de Princesa que ele vai ser motivo de piada e sua masculinidade vai ser colocada em check. Outro exemplo, mulher-macho é um elogio, homem afeminado é xingamento.

Hoje em dia, têm um bocado de gente que defende sobre criar crianças com neutralidade de gênero, mas eu aredito que na verdade isto é simplesmente impossível em nossa sociedade. Não importa o quanto eu desconstrua o conceito de gênero dentro de casa, nossa sociedade e a mídia ainda acreditam nas caixinhas do que é ser homem e do que é ser mulher. Ainda existe cor de menina e cor de menino, brinquedo de menina e brinquedo de menino, roupa de menina e roupa de menino, comportamento de menina e de menino, e todo o resto que vocês estão careca de saber. Portanto, não adianta apenas eu desconstruir o conceito dos estereótipos de gênero em casa. Eu não posso apenas ignorar  a existência dos estereótipos.

Como mãe de menino, me identifiquei bastante com a opinião da Faith. Na minha maternagem, a desconstrução destes conceitos ultrapassados e sem nenhuma base científica, têm um papel central. Meu maior foco, hoje em dia, é de ajudar o ser humaninho que tenho aqui em casa a desenvovler todo seu potencial físico, emocional e intelectual independente da genitália dele. Além é claro de ajudá-lo a construir uma consciência que respeita todos os membros de nossa sociedade e continuar a nutrir a empatia, tão presente na identidade dele. No entanto, eu não acredito que eu posso apenas passar para o meu filho a mensagem que ele pode usar o que quiser e se comportar fora da caixinha sem explicar da possibilidade dele virar vítima de preconceitos, bully, seja excluído e tudo que a gente sabe que acontece com quem está fora do que se é esperado para uma pessoa que nasce com um pênis. Tarefa muito difícil né?! Quem quer que o filho seja vítima de tudo isso aí que falei? E como que a gente ensina nossos filhos a serem o que querem ser e a se defenderem das consequências que isso vai trazer para eles? Não tenho resposta pronta de como fazer isso não, minha gente rsrsrs Sigo nas tentativas e nos erros.

Muito antes de Pandinha nascer, marido e eu já conversávamos muito sobre estas coisas de estereótipos de gênero. Não fizemos um voto em voz alta de que faríamos x ou y como nosso menino, mas por conta desta descontrução que vinha ocorrendo muito antes da gravidez, a nossa postura sobre como abordaríamos gênero em nossa casa ocorreu de uma forma em que uma conversa formal sobre o que queríamos fazer nunca foi necessária. Felizmente, eu não preciso travar uma guerra também dentro de casa para que ocorra a quebra de conceitos. Marido está nesta jornada de descontruir conceitos juntinho comigo, o que torna muito mais fácil criar o ambiente seguro para que nosso menino saiba que com a gente ele vai encontrar segurança e apoio para ir contra a maré.

Nós sabemos que Pandinha vai ser exposto a hipermasculinidade no dia a dia do seu convívio social, então aqui em casa tentamos criar um ambiente equilibrado onde suas habilidades e vontades são nosso guia. Eu debati um bocado sobre dividir aqui fotos do meu filho fora do comportamento esperado para meninos. Decidi não o fazer porque não sei o que isso pode virar para ele no futuro, então vou apenas dividir a parte escrita desta porção da nossa vida.

Muito antes de saber o sexo dele, nós compramos uma boneca que parece bebê. Pandinha adotou esta boneca como a nenê dele quando ele ainda nem sabia falar rsrs. Ele coloca a boneca para dormir, alimenta, lê livros. Com isso nosso menino segue a aprender que cuidar de criança é papel dele tanto quanto das pessoas quê tem vulvas.

Nós tentamos expor o pandinha a diversas coisas, mas admito que as vezes é difícil ser imparcial e acabamos por expondo o pequeno muito mais as coisas que gostamos. Fomos meio chatinhos com relação a exposição do Pandinha a telas. Com isso, ele não conhece muitos personagens de desenho e animações.

A primeira animação que assistimos com ele foi Lilo e Stitch. Depois de alguns meses repetindo o filme rsrs decidimos assistir Moana, pois era algo que eu também não tinha assistido e como está disponível no Netflix, foi fácil de ver. Foi paixão imediata para o pequeno. A Moana virou a heroína dele. Tanto, que a festa de aniversário dele de 3 anos teve como tema a Moana. A parte curiosa, comprei para todas as crianças que estavam na festa saias de hula e colar havaiano. Meu pequeno foi o único menino que quis usar a saia. Outro causo da paixão dele rsrsrs. Estávamos na loja da Disney e combinamos com o Pandinha que compraríamos um item na loja. Ele poderia escolher qualquer coisa, mas seria apenas uma coisa. O pedido dele? Uma camiseta da Moana. Infelizmente, ele não poderia ter escolhido um item mais difícil. Reviramos a loja. As camisetas de menino tinham apenas o Maui. Pandinha não queria o Maui, ele queria a Moana. E por qual motivo não compramos uma camiseta de menina com a Moana? Pelo simples detalhe que as camisetas para as meninas eram todas mais justinhas e com manga franzida. Ou seja, eram camisetas que seguem à risca os estereótipos de como devem ser as roupas femininas. Pequeno foi embora decepcionado e sem nada da loja. Oferecemos para ele tentar escolher outro item, mas ele não quis. Acabei depois encontrando online um pijama (feminino) e uma blusa (feminina) com a Moana. Os dois itens, tirando o babado do pijama e a cor do bordado na blusa, não são peças que reforçam demais o estereótipo feminino, então comprei sem o menor problema e o pequeno adora as peças.

A melhor amiga do nosso pequeno é nossa vizinha. Ela é 6 meses mais velha que o Pandinha e os dois se amam! Aí que ela é super fã das personagens da Frozen. Durante um período da vida dela em 2017 rsrs todas as vezes que a encontrávamos, ela estava com o vestido da Elsa. Apesar de não conhecer o filme, Pandinha ia e colocava o vestido da Ana. Quando foi se aproximando o fim do ano, resolvemos apresentar o filme Frozen para ele e bom, vocês podem imaginar o resultado hahaha ele amou. “How Far I will go”  da Moana e “Let it Go” da Frozen viraram os hinos aqui em casa. Ele corre pela casa cantando uma música ou a outra hahaha Por conta da empolgação dele com o filme e a felicidade dele de se vestir de Ana com a BFF dele, decidimos que para o Natal daríamos para ele os vestidos das personagens. Vocês não têm ideia da felicade da criança quando abriu os presentes dele e encontrou os vestidos. O tempo todo ele pede para colocar um vestido ou outro e adora ficar fingindo que ele é a Elsa e recria a cena do “Let it Go.” Já me perguntaram se deixar ele de vestido ou saia (ele têm uma saia de tutu colorida) não é um pouco demais da minha parte. Minha gente, meu filho colocar vestido vai causar exatamente o quê nele? Quando historicamente as mulheres passaram a usar calças, elas deixaram de ser menos mulheres? Qual exatamente é a diferença do meu filho se fantasiar de Super Homem ou Elsa? As duas coisas são fantasias e dão espaço para o meu filho explorar este período mágico da vida dele de fingir ser outra pessoa ou em alguns momentos, um animal rsrs.

Este fim de semana que passou, Pandinha estava com um cobertor amarrado nas costas fingindo ser uma capa. Uma moça perguntou para ele se ele era o Super-Homem. Ele respondeu que não, ele era o I (falou o nome dele) fingindo ser a Elsa. Verdade seja dita, meu filho nem sabe quem é o Super-Homem. Nem meu marido, nem eu temos muito interesse em super heróis, então nunca o introduzimos a eles. Sabemos que com o tempo, ele vai aprender com os amigos. Agora, pergunta para ele dos personagens do Harry Potter? Ou Star Wars? Hahahahaha A coisa mais fofa é ele falando Dumbledore hahahahaha

Alguns meses atrás, marido viajou sem nós e sempre que ele faz isso, ele traz um presente para cada um que ficou para trás rsrsr Nosso filho ama pulseiras e colares, principalmente colorido, que ele chama de rainbow. Aí durante a viagem, marido decidiu que queria uma pulseira com as cores do arco-íris para nosso filho. Alguns coleagas de trabalho o ajudaram a encontrar a pulseira. Uma das colegas dele comentou que era bastante admirável que ele não estava a procura de algo com ênfase em gênero para o pequeno. Na hora, ele apenas respondeu que nós não ligavamos para isso, mas ele me contou que no avião de volta para casa, ele ficou refletindo sobre o quanto ele tinha mudado; sobre o quanto procurar por algo que nosso filho gostava se tornou a primeira coisa na mente dele e não seguir normas sociais de gênero.

Entendam, não é que os papéis criados pelos estereótipos de gênero estão fora de nossa casa sem nenhum esforço nosso. Rejeitar estes conceitos é uma missão diária. Outra dia estava conversando com a Lorna sobre este tema e eu comentei que estava no processo de desconstrução e que um dia eu chegaria lá. Lorna fez um comentário que eu achei magnífico, ela disse que nós somos a geração do exercício e que talez a geração dos nossos filhos vai chegar lá. E não é verdade? Provavelmente nunca vai chegar o dia em que eu e meu marido não vamos ter que pensar sobre os estereótipos, mas vamos trabalhar até quando for possível para que as próximas gerações não sofram da forma que sofremos.

Comments

  1. Aline, essa sua série foi maravilhosa. Eu confesso que nunca dediquei muito tempo a pensar nisso, nessa questão de como estamos trabalhando as coisas para as mulheres, mas não para os homens. E é uma realidade. Você vê por aí um monte de rapazes que não sabem lidar com seus sentimentos, que se reprimem, e tudo isso se torna em violência, sempre. Violência de gênero, de orientação sexual, etc. Cabem tantas reflexões!
    E sobre seu filho, sabe que me deu uma calma? Marido tem um filho, que morou com a gente por umt empo, e hoje mora com a mãe nos EUA. E ele é criado assim, muito livre de estereótipos de gênero... fui lendo tudo que você descreveu e reconhecendo, sabe? Vestidos de Frozen, Moana, pulseiras coloridas. E me deu tranquilidade. Porque uma das coisas que me preocupa é justamente ele ser vítima de bullying... mas se existirem mais e mais crianças assim por aí, eles deixam de se tornar minoria, e deixar de ser target. E é um mundo bem melhor pra se estar <3
    E a boneca... quando conheci marido, ele era pai solteiro, e por metade da semana fazia tudo sozinho... e desde sempre baby amava sua boneca, e cuidava com o mesmo zelo que o pai cuidava dele. E acho isso tão importante. Crianças repetem padrões, e se você diversifica os padrões, elas aprendem tudo. Enfim.. poderia ficar comentando aqui por horas, porque é um tema riquíssimo. Mas deixo meus Parabéns por ter dedicado seu tempo a algo tão importante!

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