Cagar não deveria ser tão complicado – parte 2

E continuamos na nossa saga de Pandinha não conseguir fazer cocô. Vamos recapitular com detalhes:

Em Dezembro de 2016, por motivos que até hoje desconhecemos, Pandinha parou de fazer cocô. Ele ficava dias sem evacuar (mais de 10) e só fazia com muito esforço e muito choro. Ele passou a não querer andar, não querer brincar, não querer comer. Alguns meses depois, ele teve a consulta de rotina dele com a pediatra e veio o sinal vermelho: ele estava perdendo peso. MUITO peso. A médica entrou com laxativo e passamos a monitorar o peso. O peso continuou a cair e nada de ele evacuar com facilidade.

Pandinha era uma criança que estava na faixa de 95 percentil na curvatura de crescimento para peso. Para traduzir o que isso significa, se você o colocasse em uma fileira com 100 crianças típicas com a mesma idade dele, 95 das crianças teriam peso menor que o do Pandinha e apenas 5 crianças pesariam mais do que ele. Pois bem, de 95 percentil ele caiu para 30. Crianças não devem cair em sua curvatura de crescimento. As vezes rola pequenas variações, mas uma criança deve se manter dentro de sua curvatura e obviamente que com a queda gigante de percentil do Pandinha, todos ficamos imensamente preocupados.

Aqui em casa nós somos bem estritos com relação à medicações e procedimentos médicos. Sendo ainda mais rigorosos quando o Pandinha é quem precisa de uma coisa ou outra. Enfim, conversamos um montão com a pediatra dele e depois de um tempo considerável resolvemos seguir com primeiros exames de sangue para verificar possibilidade de algumas doenças. Os exames voltaram todos negativos. Aumentamos a dose do laxativo e nada. Como o peso continuou caindo, a pediatra dele então nos encaminhou para o mundo rsrs Gastroenterologista, Psicólogo e Nutricionista.

O gastro aumentou ainda mais a dose de laxantes e passou uma medicação para fazer o pequeno sentir fome. A nutricionista fez uma revisão da dieta dele e sugeriu aumentarmos as calorias dele por dia. O psicólogo sugeriu sistema de recompensa e outras estratégias para moldarmos o comportamento dele. Conseguimos estabilizar o peso, mas o problema continuou e continuamos aumentando a dosagem dele de laxativos. Chegou em um momento que ele estava tomando 3 laxantes diferentes em dosagens recomendadas para pacientes adultos em preparo para colonoscopia e ainda assim ele evacuava em uma média de a cada 7 dias.

Todos os profissionais que passamos comentou que o caso do Pandinha era bem extremo. O lance é, nossas consultas ocorrem na Mayo Clinic, que é um hospital onde os profissionais estão acostumados com o extremo. A Mayo é hospital referência no país e recebe pacientes extremos de todas as partes do mundo, então quando os profissionais daqui soltaram que o caso do pequeno era extremo e sugeriram fazermos um teste mais invasivo, nós acabamos por concordar. A suspeita era que talvez Pandinha fosse um caso atípico de uma doença chamada Hirshsprung. Esta é uma doença em que a criança nasce sem terminações nervosas em parte do intestino e por conta disso o intestino não consegue contrair para a criança evacuar. Normalmente, esta é uma doença que é diagnosticada quando recém nascido, mas há casos atípicos em que o diagnóstico só vem mais tarde.

Desde o começo o gastro comentou que esta era uma possibilidade, remota, mas era. Para realizar o exame, a criança precisa receber anestesia geral, o que é cheio de riscos, mas no fim, após quase dois anos com a coisa piorando, nós decidimos que valia a pena correr o risco para garantir que não havia nada mais sério com nosso menino.

Agora em Maio fizemos o procedimento. Não foi fácil. Fiquei tensa já na noite anterior. Madrugamos no hospital. Pequeno foi fantástico. Explicamos tudo que iria ocorrer com ele. Os profissionais do hospital explicaram para ele o que ia acontecer e apesar do receio, ele seguiu tudo que foi dito para ele. 
A carinha tensa de quem tem só 3 aninhos e precisa entender uma internação :(

Optamos por marido entrar no centro cirúrgico com ele. Como marido trabalha com parte da equipe, decidimos que era mais lógico ele seguir com o nosso menino. O procedimento foi rápido, durou uma hora, mas que para mim foi uma eternidade. Ver o pequeno sob o efeito da anestesia geral é uma daquelas lembranças não bacana que ficam cravadas na gente. Ver uma pessoa em anestesia geral não é a mesma coisa que ver alguém dormindo, então choca. Enfim, pequeno voltou da anestesia super bem e não teve nenhum efeito colateral.

Enquanto Pandinha estava no quarto, ainda sob efeito da anestesia, conversamos com o cirurgião sobre os resultados dos testes. Felizmente, deu negativo para a doença de Hirshsprung. O gastro encontrou cortes na região interna do ânus. Alguns dias depois, chegou o teste da biópsia e que apresentou uma inflamação nos intestinos deles. A parte triste, não existe um tratamento específico. O médico prescreveu uma pomada para ajudar, mas Pandinha não permite que ninguém chegue perto do ânus dele e nós respeitamos. Resolvemos cortar as medicações. Elas não estimulam ele a evacuar e causam ainda mais desconforto. O problema é que como ele fica muitos dias sem defecar, sai muita coisa e aí os cortes dele não cicatrizam nunca. Então não temos ideia de quanto isso vai mudar e se vai mudar. Pela internets da vida, encontrei uma família em uma situação parecida que o filho já tem 7 anos e o problema continua o mesmo.

Hoje estamos em uma rotina um pouco melhor do que era, ele evacua a cada 3-4 dias. O lance é que conforme os dias vão passando, ele vai ficando mais enfesado. Aí é o mesmo drama de antes: ele não anda, chora por absolutamente tudo, quer ficar deitado no sofá com a gente do lado dele. É cansativo, principalmente emocionalmente. Ficamos super limitados pois Pandinha não quer fazer nada quando chega no terceiro dia sem fazer cocô. Sair de casa é uma tortura, ele não anda e o emocional dele fica em frangalhos, fazendo-o chorar por tudo. O peso dele está estável, mas é duro olhar o gráfico de crescimento dele e ver que o peso dele hoje com 3 anos e 8 meses é o mesmo de quando ele tinha 18 meses.

Faz 2 anos e 8 meses que estamos nessa e sem ideia de quando vai mudar. Eu sei que há famílias com problemas muito maiores. Meu marido trabalha em uma UTI pediátrica, temos a noção de primeira mão que o que passamos é fichinha perto do que outras famílias passam, no entanto, não quer dizer que o que passamos está sendo fácil para nós.

Contrariando as recomendações dos profissionais, eu decidi desfraldar o Pandinha. Os profissionais eram contrário porque é bem comum o cocô ser um problema no processo de desfralde e como ele já é um problema enorme para nós, os profissionais acreditavam que poderia fazer a nossa situação pior. Como diz a minha avó, o que é um peido para quem já está cagado? Minha lógica foi de que pior do que está não dava para ficar, então meti as caras. O desfralde foi a coisa mais fácil do universo, tirando a parte do cocô que não melhorou nem piorou, então considero uma vitória. Expliquei para Pandinha que ele ia parar de usar fralda no dia x e assim foi. Aconteceu simultaneamente o desfralde diário e noturno. De dia, tivemos dois acidentes nos primeiros dias e de noite tivemos um único acidente. Desde a metade de Junho, Pandinha está sem fralda e sem sentir falta alguma dela. Acho que foi fácil para compensar o que já é difícil né?

Bom, é isso, cagar continua um drama por aqui e eu espero muito pelos dias que isto vai ser apenas uma lembrança longíqua dos sufocos da maternidade.


Comments

  1. Aline, acabei de ler os posts sobre esse assunto e vim te deixar o meu abraço mais solidário e apertado. Imagino o quão difícil está sendo toda essa situação e vou orar por vcs.
    Deus permita que tudo isso passe e que seu menino volte a ser saudável.

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    1. Obrigada, Paula! As orações, os abraços (mesmo virtuais) são sempre muito bem vindos e ajudam sim! Muito obrigada <3

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  2. Aline, ia perguntar pra voce como o Pandinha estava e vi este post. Puxa vida, achei que o problema tinha se resolvido, imagino o quanto deve ser difícil e frustrante ficar sem saber o motivo e quando as coisas irão se normalizar. Força aí e espero que muito em breve como você mesma disse, isso seja apenas um "causo" de infância!

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    1. Obrigada, Eliana! Infelizmente, continuamos nesta saga. Um dia vai melhorar! Sei que vai! Obrigada <3

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  3. Aline! Quando li o título do post achei engraçado, mas ao ler o post sofri um pouco pela sua família. Que provação! Fico contente por a situação ter melhorado um pouco e fico com esperança de tudo apenas ser uma fase. As melhoras para o pandinha. Beijos!

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    1. Obrigada, Joana! Definitivamente tem sido uma provação para nós, mas vai passar. Tenho certeza! <3

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  4. Nossa! Eu nem sei ao certo o que comentar pela situação do Pandinha. Fico feliz de saber que ele é forte e determinado e que encarou a cirurgia tão bem. E triste por não existir um tratamento certo e eficaz para resolver esse sofrimento dele. Só imagino o que você passa, o seu cansaço emocional e o principal ve-lo emocionalmente também cansado e sem poder... resolver por ele esse problema. Estou torcendo para que melhore cada vez mais, que de evacuar a cada 7 dias para 3/4, diminua para 2/3 e então para todos os dias de forma saudável!

    Um grande beijo a vocês!

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    1. Obrigada, Nadja! Tem sido bem dificil, alguns dias piores que outros, mas seguimos em frente. É bem doído vê-lo sofrendo, não vejo a hora de isto ficar para a história! Muito obrigada pelo apoio e pelas palavras! <3

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