Minha Desconstrução de Conceitos : Estereótipos de Gênero - Parte 3

Vou repetir em todos os posts que os estereótipos de gênero limitam e causam sérios problemas para todos os gêneros existentes. Há um bocado de pesquisas no tema e a conversa sobre gênero tem se tornado cada vez mais presente, no entanto, ainda existem muitas conversas que reforçam as crenças do que é ser feminino e masculino. “Homens são de Marte, Mulheres são de Vênus” do John Gray continua sendo um livro bastante popular, mas felizmente, existem muitos outros que a gente pode ler para ver as opiniões e as pesquisas realizadas no tema.

Um livro excelente que lí sobre estereótipos de gênero é “Parenting Beyond Pink and Blue: How to Raise Your Kids Free of Gender Stereotypes” da Christia Spears Brown. O livro reúne em um único canto diversas pesquisas realizadas na área e é escrito de uma forma direta e simples para quem não é da área científica. Outra parte importante que vale citar é que não estou dizendo que não existem diferenças entre os sexos biológico homem e mulher, apenas que gênero é uma construção social do que temos de referência sobre o que é comportamento masculino e feminino, e que a maioria das diferenças que atribuímos à cada um dos gêneros são apenas expectativas e não algo biológico.

Dra. Brown faz um ponto super importante em seu livro, ela comenta que em um mundo tão preocupado com as diferenças entre gêneros é importante separar o que é ciência e o que é estereótipo. Ela também faz uma ressalva muito interessante em seu livro, que é sobre as limitações nos estudos sobre gênero: estudo de gênero em criança e estudo de gênero em adultos vão trazer resultados diferentes, isto ocorre por conta de como nosso cérebro se desenvolve. Eu vou tentar explicar isso de forma bem resumida.

Ser humano não é imutável. Cada indivíduo é fruto do biológico e do meio em que vivemos. Nosso cérebro têm uma capacidade muito importante chamada plasticidade, que é a capacidade de se remodelar em função das experiências individuais, organizando e reformulando suas sinapses para "focar energia" de acordo com as nossas necessidades.

O comportamento esperado do que é feminino e masculino nos são apresentados desde que estamos dentro da barriga de nossas mães e o cérebro em formação, já vai absorvendo todas estas informações enquanto forma suas sinapses. Principalmente durante a primeira infância, nosso cérebro está a todo vapor criando estas sinapses.

Em seu livro, a Dra. Brown fez uma analogia que eu acho que vale muito a pena dividir aqui para tornar mais claro o entendimento desta função do nosso cérebro. Quando a criança nasce, o cérebro já está a formar as sinapses para decodificar linguagem de qualquer tipo. A criança não nasce sabendo em qual língua os pais vão falar, então o cérebro está aberto a processar qualquer forma de linguagem, seja ela feita em Português, Inglês, Farsi, Guarani... Só que os bebês não são expostos a todos os tipos de línguas todos os dias e as sinapses formadas para decodificar qualquer língua vão enfraquecendo. Por volta dos 10 meses de idade, as crianças passam a ouvir os detalhes apenas de sua língua nativa. Por exemplo, com 1 ano de idade, uma criança que escuta apenas Chinês, o cérebro não vai processar como forma de comunicação certos sons de quem fala Português e ela não vai entender o que a pessoa está falando. Com o passar dos anos, as sinapses para decodificar as outras línguas vão ficando cada vez mais fracas e aí vai aumentando a dificuldade em aprender novas línguas. Vocês já repararam como os Chinêses têm dificuldade para falar o R? Este é um som que não existe na língua deles, portanto, quando eles aprendem uma língua com o som de R, eles vão ter dificuldade para reproduzir o som pois o cérebro dele focou em outras partes e deixou esta sinapse de parte de docodificação de som R enfraquecida. 

Onde quero chegar com isso? Deem uma olhada no gráfico a seguir.


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Este é um gráfico típico que demonstra a pontuação de crianças em testes Psicológicos. Este gráfico específico é retirado da segunda edição do livro “How Children Develops” por Siegler, DeLoache e Eisenberg. Neste gráfico, a linha vermelha demostra os resultados obtidos por meninas e a linha azul representa os resultados dos meninos. Nesta justaposição dos resultados, é possível observar que cerca de 90% das respostas de ambos os sexos caem na mesma curvatura.

Então, se nosso cérebro é tão similar na infância, como acabamos com a crença de que Mulheres são de Vênus e Homens são de Marte? A resposta está na função de plasticidade do cérebro que expliquei antes. Com o nosso cérebro se adaptando para focar apenas naquilo que somos expostos, quando adultos, vamos nos comportar com uma influência forte do meio em que crescemos e aí fica mais difícil separar o que é biológico e o que é resultado do meio. 

Cada vez que colocamos as pessoas nas caixinhas de gênero, estamos impedindo que o cérebro continue exercitando suas sinapses para que cada pessoa desenvolva suas habilidades baseado no que a pessoa o é como indivíduo e não nas expectativas sociais. Um grande problema é que nossos conceitos do que é feminino e o que é masculino nascem da nossa cultura machista. Com isto, a equidade entre todos os gêneros continua longe de ser atingida. 

A sociedade em que vivemos está doente de várias formas e a ideia de que devemos nos enquandrar nestas representações falsas do que é ser menino e menina/ homem e mulher mata muita gente. Precisamos urgentemente rever e desconstruir estes conceitos para buscarmos uma sociedade mais saudável. No próximo post, vou falar mais sobre os problemas dos estereótipos de gêneros.

Comments

  1. Aline! Estou gostando de ler seus posts sobre os estereótipos de gênero. Obrigada por compartilhar informações!

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    1. Faz um bocado de tempo que eu estava com vários rascunhos do assunto guardados, finalmente consegui me dedicar como queria para poder publicá-los! Fico mega feliz que vc está gostando! Bjs

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